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AS RECENTES ALTERAÇÕES NA CLASSIFICAÇÃO FISCAL E A ISENÇÃO DE ICMS PARA EMPRESAS DO SETOR DE ENERGIA SOLAR

As empresas que atuam com o comércio e a industrialização de produtos utilizados na instalação de sistemas de energia solar fotovoltaicos vivem momentos de incerteza sobre a tributação de suas operações.

Isso ocorre porque no dia 1º de abril de 2022 passarão a surtir efeitos as disposições do Decreto nº 10.923/2021, que aprovou a nova Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI) com novidades em relação aos códigos de classificação fiscal (NCM) aplicáveis aos produtos utilizados pelo setor.

Essas empresas temem que as fazendas estaduais passem exigir o ICMS sobre as operações com equipamentos e componentes utilizados no aproveitamento da energia solar, que atualmente gozam de isenções.

Tal receio é fundado no fato de que as isenções mencionadas foram concedidas com base no Convênio ICMS 101/1997, o qual faz menção expressa a códigos de classificação fiscal que deixarão de ser utilizados a partir de 1º de abril de 2022, face a entrada em vigor do Decreto nº 10.923/2021.

Diante desse cenário, antes de tratar especificamente dos aspectos jurídicos desse tema, é necessário esclarecer algumas questões relacionadas ao tema. Dessa forma, para facilitar a compreensão da matéria, o texto será dividido nos seguintes tópicos:

  • O que é a classificação fiscal?

  • Breve histórico das isenções de ICMS sobre as operações com equipamentos e componentes utilizados no aproveitamento da energia solar

  • Análise jurídica das consequências das alterações nos códigos NCM aplicáveis ao setor de energia solar

O que é a classificação fiscal?

Classificação Fiscal

A classificação fiscal consiste no enquadramento de produtos e mercadorias em códigos numéricos que permitam a atribuição de diferentes tratamentos legais a esses itens a depender da origem, composição, finalidade ou qualquer outra característica que o ente tributante ou regulatório entenda relevante considerar.

No Brasil, desde 1988, esses códigos utilizados na classificação fiscal são baseados na Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), que consiste no padrão de classificação de mercadorias derivado da Nomenclatura do Sistema Harmonizado (SH), sendo este resultante do esforço internacional para definir e uniformizar a classificação de mercadorias em escala global, visando simplificar operacionalização do comércio internacional.

Importante destacar que, apesar de SH ter sido originalmente concluído há 30 anos, seus códigos passam por revisões periódicas, para que suas diretrizes permaneçam atualizadas em relação à realidade dos produtos e mercadorias transacionados atualmente.

Depois de realizadas tais atualizações, cabe a cada país internalizar as alterações de classificação que entende convenientes. É o que foi feito em dezembro de 2021, quando foi elaborado o Decreto nº 10.923/2021.

Breve histórico das isenções de ICMS sobre as operações com equipamentos e componentes utilizados no aproveitamento da energia solar

Em dezembro de 1997 foi publicado o Convênio ICMS 101/1997, que autorizou que os Estados concedessem isenção de ICMS nas operações com equipamentos e componentes para o aproveitamento das energias solar e eólica.

Em sua Cláusula Primeira, esse convênio elencou os componentes alcançados pela isenção e indicou expressamente os códigos NCM vigentes à época. Seguem alguns exemplos mencionados no dispositivo:

  • gerador fotovoltaico de potência não superior a 750W – NCM 8501.31.20;

  • gerador fotovoltaico de potência superior a 375Kw – NCM 8501.34.20;

  • células solares não montadas – NCM 8541.40.16;

  • células solares em módulos ou painéis – NCM 8541.40.32;

É importante destacar que a existência do Convênio ICMS, por si só, não efetiva a isenção nele tratada. Para que a isenção possa ser aplicada, os Estados precisam introduzir a previsão dessas isenções em suas legislações.

Nesse sentido, após a elaboração do Convênio ICMS 101/1997, os Estados passaram a prever a isenção por meio de leis estaduais. Por exemplo, o Estado de São Paulo prevê a isenção sobre operações relativas à energia solar no art. 30 do Anexo I do RICMS/SP; o Estado de Minas Gerais prevê a isenção na Parte 11 do Anexo I do RICMS/MG; o Estado da Bahia prevê a isenção no art. 264, XIX do RICMS/BA.

Contudo, em dezembro de 2021 foi publicado o Decreto nº 10.923/2021, que aprovou a nova Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI), que passou a atualizar os códigos NCM aplicáveis para o setor de energia solar. Com base nos novos critérios, alguns códigos foram alterados, outros foram agrupados e outros deixaram de existir.

Para ilustrar essa situação, cabe citar, por exemplo, os geradores fotovoltaicos que, a depender de sua potência eram classificados em subclassificações dos códigos NCM iniciados 8501.3 e passarão a ser classificados em subitens de códigos NCM 8501.7. Outro exemplo são as células solares em módulos solares que, anteriormente, eram classificados no código NCM 8541.40.32 e passarão a ser classificadas no código NCM 8541.43.00.

Nesse contexto, as empresas do setor de energia solar passaram a questionar se as isenções previstas no Convênio ICMS 101/1997 ainda permanecerão vigentes, considerando que os NCM nele mencionados não serão mais aplicáveis a partir de 1º de abril de 2022.

Análise jurídica das consequências das alterações nos códigos NCM aplicáveis ao setor de energia solar

Classificação Fiscal

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Em que pese o art. 111, II do Código Tributário Nacional determine que a legislação tributária que dispõe sobre benefícios fiscais deve ser interpretada de forma literal, a alteração dos códigos NCM aplicáveis sobre os componentes utilizados pelo setor de energia solar não pode acarretar a extinção das isenções tratadas no Convênio ICMS 101/1997.

Em primeiro plano, essa conclusão decorre de simples análise sobre as finalidade das alterações promovidas pelo Decreto nº 10.923/2021. As alterações formalizadas nesse Decreto têm o objetivo de aprimorar a classificação das mercadorias, de forma que os critérios a serem adotados se adequem melhor à realidade das empresas. Esse interesse é totalmente legítimo e não gera incompatibilidade à aplicação das isenções.

Além disso, as isenções de ICMS são concedidas com base em critérios materiais, ou seja, elas são viabilizadas em função dos benefícios que determinadas operações podem gerar aos Estados, sejam esses benefícios econômicos, sociais, ambientais etc.

A alteração formal dos códigos NCM aplicáveis aos componentes utilizados pelo setor de energia solar não tem a capacidade de impactar no benefício esperados dessas operações.

Essa interpretação já foi afirmada pelos próprios Estados no Convênio ICMS 117/96, oportunidade na qual se firmou o entendimento no sentido de que “as reclassificações, agrupamentos e desdobramentos de códigos da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias/Sistema Harmonizado – NBM/SH não implicam mudanças quanto ao tratamento tributário dispensado pelos Convênios e Protocolos ICM/ICMS em relação às mercadorias e bens classificadas nos referidos códigos.”

No mesmo sentido, a jurisprudência de diversos Tribunais de Justiça e do STJ assinalam no sentido de que a mera alteração dos critérios de classificação fiscal não pode ser fundamento para a extinção de isenções (STJ, Segunda Turma, REsp 1.311.928 – PR, Relatora Min. Assusete Magalhães, DJe 05/05/2020; TJSP, 9ª Câmara de Direito Público, Apelação Cível 1030743-16.2020.8.26.0053, Relator Des. Décio Notarangeli, DJe 05/05/2021; TJBA, 2ª Câmara Cível, Apelação Cível 0570661-07.2015.8.05.0001, Relator Des. Mauricio Kertzman, DJe 05/09/2019).

Apenas haveria a perda de efeitos das isenções tratadas no Convênio ICMS 101/1997 caso o Decreto nº 10.923/2021 majorasse as alíquotas de IPI incidentes sobre os produtos comercializados pelo setor de energia solar, mas isso não ocorreu e todos os produtos permaneces sem a tributação de IPI.

Frise-se que, nessa hipótese, a perda da isenção se daria porque o Convênio ICMS 101/1997 condiciona as isenções nele previstas à isenção (ou tributação à alíquota zero) do IPI sobre esses produtos (Cláusula Primeira, §1º), não em função da alteração dos códigos NCM aplicáveis.

Conclui-se, portanto, que as isenção de ICMS sobre as operações com equipamentos e componentes utilizados no aproveitamento da energia solar permanecerá surtindo efeitos após 1º de abril de 2022, quando entrar em vigor as disposições do Decreto nº 10.923/2021.

Caso os fiscos estaduais se posicionem a favor da cobrança do ICMS sobre as operações abrangidas pelas isenções, mostra-se viável a tomada de medidas administrativas e judiciais para afastar esse entendimento.

Por fim, espera-se que o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e os Estados adequem os termos das previsões legais que tratam das isenções sobre os produtos comercializados pelo setor de energia solar para garantir maior segurança jurídica aos contribuintes.

Dr. Alexandre Battagin

Sócio na Campos & Battagin Advogados.

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