Skip to main content

O movimento da Guerra Fiscal do ICMS existente no Brasil, com suas políticas predatórias de competição entre os estados da federação, na qual raramente um ganha e outro perde, favorecem, tão somente, o contínuo esvaziamento da união entre os estados-membros. No contexto da reforma tributária, adotar mecanismos para eliminar esse conflito político-fiscal, como o instrumento da tributação no destino, deixou de ser mera questão periférica e deve ser encarada como prioridade. É preciso conjugar interesses de todas as esferas de governo com o fito de promover o desenvolvimento econômico e a redução das desigualdades regionais.

Fato público e notório, inclusive mundialmente, que o Brasil carrega hoje uns dos mais complexos, descentralizados e paradoxais sistemas tributários, que, não raramente, dificultam investimentos, trazem custos tributários não encontrados em outras nações desenvolvidas, implicam em redução da competitividade do próprio mercado brasileiro frente ao mundo, e atrasam o desenvolvimento nacional em virtude políticas ineficientes.

O atual cenário do sistema tributário que, não raras oportunidades, dispersa investimentos, é fruto de um longo histórico de adoção de diretrizes e regras ineficientes e pouco estudadas, principalmente de forma subnacional, e da própria estruturação de um sistema difuso, com 27 entes políticos estaduais e o distrito federal adotando regras distintas, que resultam em falta de controle ou de participação da União Federal na comum adoção de regras tributárias, especialmente sobre o consumo, que representa metade da arrecadação nacional (englobando Municípios, Estados e União Federal)[1]

O estudo Doing Busines do World Bank Group, compilado em parceria com a empresa de auditoria PriceWaterhouserCoopers (PwC) revela que a América do Sul, em um contexto geral, é a região mais complexa em questões tributárias. A partir de uma média entre todos os países do continente sul americano[2] o tempo gasto anualmente para o cumprimento de todas as obrigações tributárias é de 519 horas[3].

Embora a média de horas dispendidas na América do Sul seja de 519 anuais para o cumprimento de todas as obrigações tributárias, o estudo do World Bank Group mostra que no Brasil, maior nação do continente e uma das maiores economias do mundo, o tempo médio gasto anualmente para o cumprimento de todas as obrigações tributárias atinge 1.501 horas[4], ou seja, quase três vezes a média da região total.

Muito embora ao longo dos anos esse tempo tenha diminuído consideravelmente, saindo de 2600 horas em 2004 para o atual patamar, o Brasil ainda impõe um dos maiores tempos do mundo para o cumprimento de todas as obrigações tributárias, sendo maior, inclusive, que a Bolívia, onde o tempo médio é de 1.025 horas, de acordo com o estudo divulgado.

Ocorre que, não é coincidência que o Brasil seja um dos destaques – do lado negativo – nesse importante estudo realizado anualmente e que gera fortes influências em investidores e empresas. Um dos destaques – que será mais profundamente abordado nesse artigo – certamente é o desenho da tributação do consumo, iniciada a partir da década de 1960, quando em 1967 introduziu-se a figura do ICMS (Imposto de Circulação de Mercadoria), de competência estadual, não cumulativo e em substituição ao antigo IVC (Imposto sobre Vendas e Consignados) também de competência estadual.

BREVE PERFIL HISTÓRICO DO ICMS

Tecendo breves comentários, a implementação desse tributo se deu em um contexto de ampla reforma tributária ocorrida entre os anos de 1965-1967, no início do período da Ditadura Militar. Muito embora o atual ICMS seja a figura central na conhecida Guerra Fiscal, o presente trabalho não tem o objetivo de analisar as estruturas do ICMS como tributo específico e de maior representatividade na economia dos estados atualmente.

Contudo, conforme será abordado, é certo que algumas estruturas vigentes até hoje desse tributo são relação de causa-consequência da atual fragilidade federativa que o Brasil vive, reforçada pela Guerra Fiscal predatória em curso e que não é encontrada em nenhuma outra nação do mundo.

A partir dessas premissas, a tributação do consumo de bens e alguns serviços, através do ICMS, ocorre de forma amplamente descentralizada, com maior ênfase a partir da Assembleia Constituinte de 1987/1988, que objetivou antagonizar a centralização que os governos da Ditadura Militar aplicaram nas décadas anteriores. Em outras palavras, a estrutura do ICMS vigente hoje permite que cada estado da Federação institua suas regras de tributação pelo ICMS, respeitadas as balizas da Constituição Federal e da Lei Complementar nº 87/96, conhecida como Lei Kandir.

Porém, a especial atenção na autonomia dos estados para instituírem suas regras de tributação sobre o consumo, pelo ICMS, foi nascedouro para um explícito conflito entre as unidades federadas, que resultaram hoje na fragilidade do sistema federativo, onde cada unidade federativa busca ganhos fiscais e políticos, à revelia da Lei e sempre ao ônus de outra unidade federativa.

Sob essa ótica, a descentralização na competência para tributação sobre o consumo, especialmente pelo ICMS, acompanhada do sistema híbrido de ajustamento de fronteira, em tributação na origem e no destino para operações interestaduais, com cada unidade federativa estabelecendo regras próprias de alíquotas, concessões, incentivos fiscais, indiretas manipulações de base de cálculo e a ausência efetiva de uma federação forte, resultaram no nascimento de uma competição predatória entre os estados da federação, atualmente denominada “guerra fiscal”, na qual inexiste qualquer vencedor, onera aqueles que são contribuintes econômicos e prejudica profundamente o desenvolvimento nacional.

O MOVIMENTO DE GUERRA FISCAL

O movimento de guerra fiscal existente entre os estados da federação no Brasil acontece, principalmente, por intermédio da concessão de incentivos fiscais descontrolados, precipuamente como instrumentos de políticas industriais. O sistema, tal como arquitetado e com as alterações trazidas pela Lei Kandir, favorece que os estados concedam incentivos fiscais, na maioria das vezes sem qualquer análise de benefícios e malefícios, tampouco análise dos impactos gerais sobre o país em si, justamente em virtude da autonomia conferida a eles por Lei para regular matérias de política fiscal.

O SISTEMA HÍBRIDO DE TRIBUTAÇÃO NA ORIGEM E NO DESTINO

Por isso que, o atual sistema híbrido de tributação na origem e no destino faz com que para as operações interestaduais exista a repartição de receita entre os estados origem e destino. Tal previsão encontra-se hoje na Constituição Federal, e a qual estabelece regras para recolhimento do chamado “ICMS-Difal”. Porém, a onerosidade que se destaca dessa modalidade é que a maior fatia de receita fique com o estado produtor, que não é, nessa operação específica, o mercado consumidor daquele produto.

Não somente, essa diferenciação de alíquota favorece que no estado de origem haja redução do imposto a recolher como política de incentivo fiscal para atrair investimentos produtivos. Ricardo Varsano, em citação realizada no livro “Avaliação da Estrutura e do desempenho do sistema tributário brasileiro”, dos autos José Roberto Rodrigues Afonso, Julia Moraes Soares, e Kleber Pacheco de Castro[5], destaca que;

[…] há maior incentivo ao estado produtor para usar tal instrumento sob o regime de origem, do que ao estado consumidor sob o regime do destino, pois a mobilidade dos fatores de produção, destacadamente a do capital, é maior do que a mobilidade do consumidor

Em outras palavras, o estado produtor, no contexto de atrair investimentos do setor produtivo e em segundo plano favorecer a geração de renda e emprego aos cidadãos daquele estado, concede incentivos fiscais de redução do imposto ser pago na proporção da origem em operações interestaduais, justamente para ter entre suas fronteiras empresas produtoras, que poderão gerar outros ganhos fiscais. Tal situação se mostra mais favorável pois, como mencionado acima, a mobilidade do capital é maior do que mobilidade do consumidor.

Isso é possível graças à relação inversamente proporcional entre a autonomia política e financeira do estado e a capacidade reguladora de um órgão federado, capaz de desenvolver políticas regionais equânimes ou que, ao menos, evite políticas unilaterais de agravamento da Guerra Fiscal. Ou seja, à medida em que ao longo dos anos a autonomia financeira e política dos estados foi aumentando, com o agravamento dessas políticas unilaterais, a unicidade federal, através do órgão regulador, foi perdendo forças e capacidade de controlar tais condutas, estabelecendo uma relação inversamente proporcional que culmina, nos dias atuais, em desrespeito à própria Lei Complementar

O CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA FAZENDÁRIA

Quanto a isso, na década de 70, muito antes da promulgação da Lei Complementar 87/1996, entrava em vigor a Lei Complementar 24/1975, responsável por criar o Conselho Nacional de Política Fazendária, na sigla CONFAZ, um órgão colegiado formado pelos Secretários de Fazenda, Finanças ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal e o qual compete, precipuamente, “celebrar convênios para efeito de concessão ou revogação de isenções, incentivos e benefícios fiscais e financeiros relativos ao ICMS”[6]

O Brasil, como país continental e na mesma linha com inúmeros outros países, inevitavelmente possui disparidades regionais, ou seja, é de conhecimento que as regiões Sul e Sudeste historicamente são mais desenvolvidas que a região Norte e Nordeste, inclusive por uma questão de formação histórica centenária, que nos tempos atuais não se mostra oportuno contestar, ao contrário, necessário se faz adotar medidas que possam dirimir essas disparidades existentes.

Assim, uma política consciente e regulada de concessões de incentivos fiscais para atrair investimentos produtores, com a necessária aprovação do CONFAZ, teriam esse condão, isto é, estados menos favorecidos, na acepção original, poderiam conceder incentivos fiscais para atrair investimentos produtivos como medidas de defesa na busca da equalização e reversão da concentração industrial no país. Uma federação forte e unida teria a consciência de que regionalidades menos favorecidas precisam de incentivos para atrair investimentos produtivos para diminuir disparidades, gerar renda e emprego dos cidadãos daquela localidade.

Ou seja, em última análise, a existência do sistema de tributação na origem e no destino em nada deveria afetar a harmonia entre os estados, uma vez que, cabe aos membros do CONFAZ aprovar concessões de isenções e outros inventivos relacionados à tributação interestadual sobre o consumo. Não somente, de acordo com a própria Lei Complementar 24 de 1975 a aprovação depende de decisão unânime dos estados representados[7], em reunião presididas por representantes do Governo Federal[8] e estipula penalidade para aqueles que desrespeitarem esses seus dispositivos.

Se não bastasse tais medidas unilaterais e sem qualquer senso de união, atrair investimentos produtivos já situados em outra localidade, justamente pela maior mobilidade do capital frente ao mercado consumidor, como apontamos no início deste trabalho, é visto, do ponto de vista de política fiscal, como desperdício de recursos públicos, que resulta em renúncia de benefícios aos próprios cidadãos e contribuintes daquele estado, em verbas que poderiam ser investidas em outras áreas, ou seja, um jogo de soma zero, derivado de má gestão e com claro desperdício infundado de recursos públicos.

Ocorre que, a discussão que envolve o conflito de cooperação entre os entes federados e a fragilidade na federação em si são mais profundos que a existência do CONFAZ que, em tese, se observada a Lei Complementar nº 24 de 1975 evitaria que incentivos fiscais fossem concedidos de forma descontrolada e generalizada. A estrutura atual do sistema tributário relacionado à tributação do consumo na competência estadual favorece irregularidades e possibilita a atribuição de ônus tributários a diferentes estados, em decorrência das operações de exportação indireta e, também, de operações interestaduais com diferenciais de alíquotas.

À vista disso, o instrumento de tributação no destino tem em sua essência a desoneração da exportação, ainda que dentro do país (operações interestaduais), de bens e serviços, deixando a receita tributária ao estado de destino. Com isso, transforma-se o ICMS que é um tributo sobre a produção e sobre o próprio consumo em um imposto unicamente sobre o consumo, esvaziando o alto poder de barganha que os estados mais desenvolvidos se utilizam, com relação ao ICMS produção, para atrair investimentos produtivos.

O INSTRUMENTO DE TRIBUTAÇÃO NO DESTINO NOS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA.

À título de comparação, a tributação no destino já é adotada desde os primórdios nos países da União Europeia que adotam o IVA, imposto similar ao ICMS, tanto nas operações entre os membros quanto nas operações ao mercado exterior. Ou seja, não se cobra IVA no país que exporta bens e serviços.

Por analogia, a soberania de cada país-membro da União Europeia pode ser equivalente à autonomia que os estados que integram a federação possuem para estabelecer as regras em relação ao ICMS incidente sobre o consumo. Naquelas localidades, dotadas de soberania, a perca de receita em decorrência de abuso das operações com tributação no destino e ao comércio-formiga é muito pequena em relação aos benefícios que a tributação no destino carrega.

No Brasil esses benefícios são ainda maiores em virtude do potencial solução da problemática trazida pela Guerra Fiscal. Quanto a isso, o autor Isaias Coelho, no artigo Um novo ICMS – Princípios para reforma da tributação do consumo[9] traz a seguinte análise em relação a essas questões pontuais;

Na Europa, as perdas de arrecadação devido ao abuso do sistema de destino (vendas internas disfarçadas de exportações) têm sido um problema menor, apesar de não existiram barreiras fiscais nas fronteiras entre países da União. Igualmente, as vendas do comércio-formiga, em que as pessoas cruzam a fronteira para adquirir bens e serviços onde o IVA tenha alíquota menor, são fenômeno muito limitado, sem impacto significante na arrecadação. Resta como preocupação maior a fraude do “carrossel”, discutida abaixo, que independe de o imposto ser cobrado na origem ou no destino.

Com relação aos temores de abuso das operações com tributação no destino e ao comércio-formiga, o Brasil possui hoje avançado sistema de controle fiscal de transações. As notas fiscais eletrônicas (NF-e), os sistemas de escrituração digital (SPED) e os Conhecimentos de Transporte (CTE) permitem validar a emissão dos documentos fiscais de forma simultânea entre a empresa vendedora e a empresa compradora e verificar, inclusive, com o transporte realizado, de modo que a tributação no destino pode ser implementada observando esses documentos fiscais, no rastro da nota fiscal.

Não somente, a tributação do destino favorece a eliminação de distorções na responsabilidade da concessão de créditos tributários tanto em operações interestaduais, mas mais especificamente em operações de exportação direta e indireta, quando um estado beneficia-se pelo recolhimento dos impostos incidentes sobre as compras de insumos que a atividade produtora faz e outro é obrigado a conceder créditos tributários pela saída da mercadoria para a exportação, em virtude da imunidade prevista na Constituição Federal e do princípio basilar da não cumulatividade formadora do ICMS.

Adotar a tributação no destino, inclusive para operações com destino a outros estados do Brasil reduz drasticamente a utilização dos incentivos de ICMS como instrumento de política fiscal isso porque a partir desse princípio todas as mercadorias destinadas ao mercado consumidor em outro estado ou ao mercado exterior são tributados integralmente no destino e deixam de servir como base para concessões de incentivos fiscais.

Além disso, a própria Constituição Federal[10] veda aos estados estabelecer diferenças tributárias com base na procedência ou destino das mercadorias ou serviços, não havendo margem para que estes estados tentem privilegiar produtos ou serviços integrantes do ICMS produzidos internamente.

À vista disso, adotando o princípio da tributação no destino, haveria a consequente eliminação do ônus tributário representado na imagem colacionada acima, de modo que um estado não teria que arcar com a concessão de créditos para operações que se iniciaram em outros estados, com vista a respeitar o princípio da não cumulatividade.

Assim, em tese, única maneira de conceder incentivos fiscais, a partir da adoção da tributação no destino seria para empresas situadas internamente na unidade federada e que pretendem dirigir o escoamento de sua produção internamente.

AS PROPOSTAS DE REFORMA TRIBUTÁRIA PROPÕEM A ADOÇÃO DO INSTRUMENTO DE TRIBUTAÇÃO NO DESTINO.

Atualmente, a adoção do instrumento de tributação no destino está inserida nuas duas principais propostas de Reforma Tributária que tramitam no Congresso Nacional. Tanto a PEC 45/2019[11] quanto a PEC 110/2019[12] estabelecem, entre outras amplas alterações que não se mostram pertinentes para este trabalho, a adoção do destino na tributação do consumo. Ainda que as propostas estabeleçam a reunião de diferentes tributos no chamado Impostos sobre Operações Com Bens e Serviços (IBS) é certo que existe uma esperança de substituição do atual sistema híbrido de tributação na origem e no destino para tributação somente no destino, com vista a favorecer a simplificação tributária e reduzir drasticamente a existência do fenômeno da Guerra Fiscal.

A curto prazo a proposta de tributação no destino, inseridas nos textos normativos que tratam da Reforma Tributária, tende a encontrar bastante resistência, principalmente das unidades federadas mais desenvolvidas e que podem suportar renúncias fiscais para atrair investimentos produtivos. Porém, a partir da ideia de fortalecimento da Federação como um todo, sustentada por um Governo Federal enquanto União de todas as unidades federadas e pela maior participação da sociedade civil, no longo prazo tal medida certamente trará vantagens que beneficiarão, em última instância, o próprio país e sua competividade, inclusive, contra penetração de mercadorias similares do mercado internacional.

Não somente, a adoção da tributação no destino para operações interestaduais também favorece a simplificação tributária, a partir da eliminação das alíquotas interestaduais, repartições de receitas e obrigações de apuração de recolhimento do chamado “ICMS-Difal”, também disposto na Constituição Federal[13]. Ademais, partir da disseminação das ideias que estruturam essa alteração, entes federativos menos desenvolvidos, que compõe a federação, poderão se beneficiar e é nesse momento que o fortalecimento da federação, inclusive, a partir do próprio CONFAZ e do Governo Federal, se mostra necessário, justamente para promover um desenvolvimento mais equânime, onde mesmo que um estado saia perdendo – frisa-se a curto prazo – outros possam ganhar para se desenvolver e ainda assim ficarem muito distante daqueles já desenvolvidos.

O fortalecimento da federação, a partir da adoção do princípio da tributação no destino, pode ser favorecida, a partir de mútuos interesses e em um futuro próximo, na unificação de regras relativas ao ICMS, tendo em vista que, em âmbito estadual, ainda se caracterizam como o principal tributo arrecadado. Tal unificação poderia abranger base de cálculo e regras atinentes a todos os estados da federação nas operações interestaduais.

CONCLUSÃO

Em conclusão, portanto, a Guerra Fiscal existente no brasil, com suas políticas predatórias de competição entre os estados da federação, na qual raramente um ganha e outro perde, favorecem, tão somente, o contínuo esvaziamento da federação como um todo, em um movimento único que não é encontrado em outros países. O resultado disso é a renúncia de receitas, ausência de desenvolvimento nacional como um todo, estagnação econômica, e projetos políticos particulares que resultam na sobreposição do interesse particular sobre o público e que, nos moldes atuais da tributação subnacional do consumo, só tendem a crescer no longo prazo.

Não somente, o modelo atual de tributação na origem e no destino para operações interestaduais e a sistemática de responsabilidade no pagamento de créditos fiscais para relações interestaduais e com destino ao exterior, fortalecem a concessão descontrolada de incentivos fiscais, sem qualquer justificativa ou estudos capazes de entender e projetar ganhos fiscais para o estado, além, claro, de impor ônus tributários na operações subsequentes isentas ou imunes aos estados que não procederam com a recolha dos tributos incidentes nas operações anteriores.

Com isso, a adoção da tributação no destino para operações destinadas ao exterior, tanto para exportação direta, quanto indireta, nesta última pela adoção da tributação no destino em operações interestaduais, tem o propósito de reduzir drasticamente e, me arrisco a dizer, eliminar, o movimento de Guerra Fiscal entres a unidades federadas, com a consequente eliminação das alíquotas interestaduais.

No curto prazo, algumas unidades federadas mais desenvolvidas, onde o investimento produtivo atualmente está localizado justamente pelo suporte financeiro advindo de renúncias fiscais, tendem a perder receita por se tratar de exportadores líquidos.

Porém, em oposição, estados menos desenvolvidos, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, conhecidos por serem mais importadores líquidos, tendem a se beneficiar dessa sistemática, primeiramente pelo aumento arrecadatório e, em segundo plano, pela possibilidade de concessão de subsídios fiscais aos menos favorecidos, reduzindo a carga tributária sobre produtos mais essenciais.

No longo prazo, essa alteração tende a fortalecer a federação, eliminar a competição predatória e possibilitar um desenvolvimento mais equânime entre as regiões do Brasil. Não somente, futuramente, a partir de um comum acordo, poderiam os estados, fortalecidos em uma Federação mais centralizada, harmonizar regras tributárias gerais, tais como base de cálculo dos impostos sobre o consumo em operações interestaduais, restando-lhes definir alíquotas a depender das suas políticas tributárias.

Por isso que, em paralelo a todas as discussões existentes sobre a estruturação da Reforma Tributária pelas PECs 45/2019 e 110/2019, no que tange a reunião de tributos, mudança na arrecadação, simplificação de obrigações acessórias, eliminação de manipulação de bases de cálculo, é certo que o instrumento de tributação no destino se mostra pertinente e necessária em qualquer proposta efetiva de Reforma Tributária, isto pois, não deixa de efetivamente promover uma justiça fiscal e possibilita a eliminação de políticas fiscais infundadas e que, em último análise, somente resultam e renúncia descontrolada de receita por parte dos Estados membros, na insaciável corrida pra atração de empresas aos seus contornos fronteiriços, inclusive, como projeto político individual e sem qualquer benefício de ordem geral.

Por fim, e mais importante, a tributação no destino mostra-se importante para eliminar uma das maiores mazelas existentes no sistema atual, conforme largamente demonstrado, que é justamente o suporte do ônus tributário por estados que não recolheram tributos incidentes sobre operações interestaduais, tanto nacional quanto destinadas ao mercado exterior de forma indireta ou direta, fazendo com que deixem de perder receita, de forma que o ônus tributário sobre essas operações se torne mais equânime, tendo a tributação no destino como instrumento, inclusive, para, no longo prazo, fortalecer a federação na tributação sobre o consumo.

[1] https://www.valor.com.br/sites/default/files/infograficos/arte/2019/09/19/especial_tributos_v2/tributos_v2.html

[2] https://www.doingbusiness.org/content/dam/doingBusiness/pdf/db2020/PayingTaxes2020.pdf. Argentina; Bolívia; Brasil; Chile; Colômbia; Equador; Guiana; Paraguai; Suriname; Uruguai; Venezuela; RB

[3] https://www.doingbusiness.org/content/dam/doingBusiness/pdf/db2020/PayingTaxes2020.pdf. P. 8

[4] https://www.doingbusiness.org/content/dam/doingBusiness/pdf/db2020/PayingTaxes2020.pdf. P. 16

[5] AFONSO, José Roberto Rodrigues, SOARES Julia morais, CASTRO, Kleber Pacheco. Avaliação da Estrutura e do Desempenho do Sistema Tributário Brasileiro. Banco Interamericano de Desenvolvimento. P 100/101, disponível em /http://idbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=37434330

[6] https://www.confaz.fazenda.gov.br/menu-de-apoio/historico

[7] LC nº 24/1975, artigo 2º, §2º

[8] LC nº 24/1975, artigo 2º, caput.

[9] COELHO, Isaias. Um novo ICMS – Princípios para a reforma da tributação no consumo. P. 35, disponível em http://www.funcex.org.br/publicacoes/rbce/material/rbce/120_IC.pdf

[10] Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.

[11] § 3º Nas operações interestaduais e intermunicipais:

I – incidirá a alíquota do Estado ou Distrito Federal e do Município de destino;

II – o imposto pertencerá ao Estado ou Distrito Federal e ao Município de destino.

[12] VII- sem prejuízo do disposto nos arts.156-A e 158, V, o imposto pertencerá ao Estado de destino do bem ou serviço, nos termos da lei complementar, que poderá estabelecer:

[13] artigo 155, incisos VI e VII, Constituição Federal.

Artigo relacionado:

BREVE REFLEXÃO SOBRE OS DESAFIOS DA TRIBUTAÇÃO SUBNACIONAL DO CONSUMO NO BRASIL E AS PROPOSTAS DE REFORMA TRIBUTÁRIA, NO CONTEXTO DA ECONOMIA DIGITAL

Dr. Cezar Camilotti Filho

[email protected] |

Leave a Reply